Exclusivo: Conheça um pouco de Manelito Dantas Vilar - primo de Ariano Suassuna
Na tarde deste sábado(08.07)
estivemos na Fazenda Carnaúba, em Taperoá(PB), a 217Km de Arcoverde, onde conhecemos um pouco da história de Manoel
Dantas Vilar - mais conhecido por todos com Manelito, primo do escritor Ariano
Suassuna. Outras duas fazendas - Pau Leite e Bonito - são da família. Confira:
*Por Muriê Moraes
O HOMEM
Aos 78 anos, vestindo um pijama
branco, Seu Manelito nos recebe na varanda da casa-sede. Rodeado por filhos,
filhas e pelos netos Pedro e Chico, ele se mostra uma pessoa solícita e cheia
de animação. Pede que a secretaria nos sirva cafezinho, acende um cigarro e
começa a prosear. “Essa é a sétima
geração da família, sempre fomos muito ligados ao campo, veja eu mesmo sou um
engenheiro civil e professor aposentado(ex-catedrático de Hidrologia da
Universidade Federal da Paraíba/UFPB),
mas há muito tempo venho me dedicando à pecuária”, diz.
Perguntamos que livro lhe marcou
e Seu Manoelito não titubeia: “Gosto da
Bíblia afinal lá encontramos uma verdadeira crônica da vida de um povo no
deserto, penso ver uma analogia ao sofrimento do sertanejo”, afirma. E o
melhor filme: “Gosto muito das comédias
de Charles Chaplin, mas ele fez também dramas românticos como ‘Luzes da Ribalta’
onde é um palhaço de teatro bastante famoso, mas um bêbado o salva do suicídio e
tem também uma jovem dançarina chamada Thereza”, relembra.
E a TV? “Não sou muito de ver, assisto por vez o Jornal Nacional - o verdadeiro
mensageiro da má notícia, quando tem uma novela que preste aí eu dou uma chance
e assisto”, afirma. E o melhor livro do primo Ariano? “Aprecio muito ‘A Pedra do Reino’, a história é bastante original e é contada
pelo personagem Pedro Diniz Ferreira Quaderna - primeiro ele está preso durante
o período do Estado Novo (1937-1945), em Taperoá, na Paraíba, e começa a
escrever sua história, a partir das memórias de seus ancestrais. Depois aparece
como um velho palhaço que conta seu passado num teatro improvisado no centro do
vilarejo. No final, enfrenta o juiz corregedor que investiga a morte de seu
padrinho, Dom Pedro Sebastião Garcia-Barreto”, explica. Na verdade, para
compor a obra, Ariano se baseou nos principais elementos da cultura popular nordestina - a literatura de cordel, os repentes, a embolada – dando
assim origem a um universo mítico, criando uma espécie de Reino de Camelot no meio
da caatinga.
E o futuro do
Nordeste? “Há 200 anos se discute
projetos de irrigação para o Nordeste brasileiro, com gastos e estudos
mirabolantes que nunca saíram do papel e quando saíram os resultados foram
desastrosos; por isso, acredito que a Transposição do Rio São Francisco não
dará certo, porque a interligação de bacias é uma técnica que precisa de muitos
estudos para evitar a contaminação e salinização do solo. A solução está no
desenvolvimento da técnica de se criar animais resistentes à seca e a
introdução e cultivo de plantas adaptadas ao Semi-Árido”, argumenta.
Sobre o primo famoso, Manelito é
comedido, mas não menos emotivo e cheio de saudade. “Ariano era tudo ao mesmo tempo: companheiro, amigo, compadre; ele vinha
aqui sempre em janeiro, fevereiro e julho - às vezes coincidia com as férias
escolares, tinha a casa aqui ao lado, tinha uma certa privacidade”, lembra
adiantando que depois que os filhos cresceram ele veio menos. “Meu primo comprou também um sítio aqui perto
e batizou de 'Malhada do Gato'”, disse. “Certa vez ele deu um quadro a minha mulher Clívia Guedes Pereira, tá lá
na minha sala”, diz. E a família? “Tenho
cinco filhos, todos envolvidos com as fazendas; os dez netos são uma alegria,
ei neto não é melhor que filho?, indaga. O neto Chico, de 3 anos, é o xodó.
“Eu pergunto: cadê o dedo de vovô e ele
levanta o polegar; depois pergunto pelo dedo do irmão dele e Chico aponta o ‘dedo
médio’ - típico de ofensa”, conta rindo.
E os estrangeirismos? “No Brasil as pessoas tem mania de inglesar
ou afrancesar tudo; você mesmo tem seu site que se pronuncia saite, na minha
fazenda, eu não permito imitar receitas dos franceses”, garante. A frase
foi dita após o repórter dizer que era responsável por um site de Arcoverde. “Sim,
Arcoverde a velha Rio Branco”, comenta Manelito.
E a juventude: “Rapaz mesmo com todo esse mato em volta eu
nunca fui de caçar, tenho adoração pelos animais; já meu irmão Roberto Dantas
era o maior atirador de baleadeira que já vi, falo desse tipo de caça, era um
tipo de atiradeira usada para disparo de projéteis impulsionado pelas mãos com
auxílio de elásticos. Outro irmão - Marcelo Dantas - apreciava as brincadeiras,
depois se transformou em economista que muita gente acha ser sinônimo de
mentiroso”, comentou em tom de brincadeira.
E o convívio com os pássaros? “Olha
fico algumas horas aqui na varanda e noto que os passarinhos têm uma espécie de
código de comunicação, quando as visitas rareiam eles passam meio tímidos,
depois quando sentem a presença dos da casa ficam numa algazarra danada, essas
criaturinhas são muito sabidas”, argumenta ao ver além do terraço sabiás,
sanhaçus, golinhas, galos de campina, azulões etc.
Ao final da conversa, Manelito me
olha e diz: “Você foi um dos poucos jornalistas que veio aqui e não centrou o
papo em Ariano, deixou que eu falasse outros temas”.
Eu cá com meus botões não sei se
foi um elogio, mas vindo de Seu Manoelito tenho minhas ressalvas em não me gabar.
Afinal, o primo de Ariano prefere acreditar que jornalista é um tipo adepto do óbvio ou
que não passa de “arauto da chatice”.
Enfim, só posso dizer - muito obrigado
Seu Manelito!!!
A FAZENDA
A Fazenda Carnaúba é referência
nacional quando o assunto é genética de caprinos, ovinos e bovinos. A unidade familiar
em produzir no semiárido nordestino rende à propriedade, de 960 hectares, altos
índices de produtividade na criação de raças nativas de caprinos, ovinos e
bovinos, tanto de leite, quanto de corte. No plantel, são criadas apenas raças
nativas, sendo oito ovinas (Barriga Negra, Cariri, Morada Nova Pretas e
Vermelhas, Jaguaribe, Cara Curta, Somalis e Santa Inês), dez caprinas (Parda
Sertaneja, Moxotó, Graúna, Serrana Azul, Repartida, Canindé, Marota, Mucianas
Pretas e Caobas, e Biritingas) e três raças bovinas zebuínas (Guzerá, Sindi e
Gado Pé Duro).
O leite, proveniente de caprinos
e bovinos, é processado no laticínio da própria fazenda para produção e venda
de queijos artesanais. A produtividade média é de 13 a 14 litros/dia da raça
Guzerá, 11 a 12 litros/dia da raça Sindi e 2 litros por dia de cabra. A
nutrição dos animais provém do aproveitamento de capins nativos do semiárido,
da semeadura do capim Buffel de origem africana e da palma forrageira de origem
americana (semeada em solo corrigido com adubo orgânico e químico, sem o uso de
irrigação).
De acordo com Joaquim Dantas(um dos filhos de Manelito) o tio
Ariano botou o nome de Grupiara, que significa veio de diamantes, porque dizia
ele que o laticínio é o diamante da fazenda. Feitos de leite de pasteurização
lenta(o que agride menos a cultura láctea responsável por sabor e textura) os
queijos são maturados e podem, para facilitar o entendimento, ser comparados a
um cablanca. O teor de sólido do leite dessas cabras sertanejas é maior que a
das cabras europeias. Enquanto o rendimento das raças estrangeiras é de dez
litro de leite para cada quilo de queijo, o das brasileiras chega a sete para
um.
Os queijos da Grupiara são
divididos em três tipos. Como nomes inéditos e sem reverência europeia, o tipo
branco é chamado de arupiara e recebe um segundo tratamento térmico além da
pasteurização. Os do tipo cariri são temperados com ervas e vegetais. Todos
rigorosamente da região: aroeira, marmeleiro, alfazema e cumaru. Há ainda uma
pasta, temperada com alho e cebola (que deve estar em pelo menos seis horas de
temperatura ambiente para exibir a potência de sabor e aroma). As embalagens
são estampadas com iluminugravuras de Ariano Suassuna trazendo, é claro, desenhos
de cabras.
TAPEROÁ
Andando por Taperoá pouco se nota
algo que ligue ao filho famoso. Muito pouco se tem de Ariano fora mesmo os
objetos de arte que estão na casa-sede da Fazenda Carnaúba. Dizem os moradores
que, à época da morte do escritor, foi levantado um pórtico em sua homenagem
num dos acessos da cidade. No entanto, a reportagem do www.muriemoraes.com.br não atestou a
existência do pórtico. Se serve de consolo ou não serve, o prédio da Secretaria
de Cultura do município é meio futurista e traz imagens e motivos nas paredes
que lembram mais o xilogravurista J. Borges(da cidade de Bezerros) do que o
autor do Auto da Compadecia.
Vamos aqui
pinçar um pouco de história. Na verdade, os principais núcleos de vida e de
desenvolvimento de Taperoá se denominaram Serrote, Bonito, Salgado, Carnaúba e
Cosme Pinto. Aqui a origem mais remota do Município de Taperoá. Na área da
cidade atual foi travada, em 1824, uma grande batalha entre os republicanos da
Confederação do Equador, que tentavam uma retirada para o Ceará, e as forças
legalistas. Estas últimas foram as vitoriosas - o que resultou o nome de
Batalhão para a localidade, em memória da grande batalha (batalhão) que ali se
havia travado.
Há, porém,
quem queira relacionar o primitivo nome de Batalhão aos choques armados com os
remanescentes índios cariris e os primeiros civilizados que penetraram na
região e lá se estabeleceram. Em qualquer das hipóteses, a primitiva
denominação de Batalhão lembra uma grande peleja. Focalizando melhor os
primórdios da sede do Município e a sua evolução, em 1830, Manuel de Farias
Castro, descendente dos Farias Castro de São João do Cariri, funda uma fazenda
na área da atual cidade de Taperoá. Aí passou a residir e constituiu família.
Seus filhos e genros passaram a habitar,a povoar e a explorar os sítios
denominados Campos do Coxo, Várzea do Sales e Alto Batalhãozinho. A estes, veio
logo se juntar o português Costa Vilar que, com seus descendentes e agregados,
muito contribuiu para o desenvolvimento da vida local.
Em 1860,
teve origem a ideia da construção de uma capela em torno da qual se concentrou núcleos
populacionais. Essa construção, porém, só foi iniciada em 1865, depois de
resolvida a divergência entre Manuel de Farias Castro, Silvério de Farias
Castro e seu cunhado Sales, sobre o local exato em que se deveria erguer a
capela. Começaram as obras sob a orientação espiritual do missionário Hermenegildo
Herculano Vieira da Costa (frei Herculano). Os trabalhos correram lentamente e
só foram concluídos em 1874, já sob a direção eclesiástica do padre José
Antônio Maria Ibiapina.
*Em tempo: O site agradece ao amigo Dijnaldo Galindo que oportunizou nossa ida à Fazenda Carnaúba.
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Manelito Dantas aparece ladeado por Dijnaldo Galindo e pelo jornalista Muriê Moraes - uma tarde de boa conversa |
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Casa em que Ariano Suassuna ficava quando visitava o primo Manelito Dantas - o escritor vinha sempre nas férias escolares |
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Os produtos da Fazenda Caranaúba trazem embalagens personalizadas com o traço armorial de Ariano Suassuna |
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A casa-sede da fazenda tem cores vivas ladeada por dois alpendres onde Seu Manelito aprecia o canto dos passarinhos |
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